"Para a minha mãe, que faria hoje 50 anos, e sempre desejou ter um gato laranja que não chegou a tempo..."
A frase demorou a sair-me da retina, do pensamento e do coração. Quem a disse foi Eunice, que a fez acompanhar, com o seu excepcional talento para a ilustração, da pintura em aguarela de dois gatos... Um preto e branco ao lado de um laranja, o tal...que não chegou a tempo.
Eu li, vi, sorri, chorei... Pensei, com tempo, nas vezes em que não cheguei a tempo... E no que perdi por perder tempo com coisas que não valem o tempo que se perde com elas...
Aqueles cinco minutos em que paralizei o olhar numa qualquer montra e, tonta, não olhei, não sorri, não abracei ninguém.
Aqueles dez minutos que demorei a decidir, entre tantos iogurtes que nas prateleiras havia, qual era o tal... Tanto tempo perdido num gesto tão banal...
E aquelas três horas que perdi num tal mega centro comercial, o tal Dolce Vita, que Portugal inteiro já visitou...Três horas!!!!
As mesmas três horas em que não cheguei a tempo de me despedir da vida... do meu avô.
E aqueles inúmeros quarenta minutos que já perdi em filas do supermercado.... Aqueles quarenta minutos em que não estive ao seu lado...
E se pensar em todas aquelas horas, tantas, que perdi no trânsito da 2ª Circular???? Quantos passeios à beira- mar, de mão dada à alegria das minhas crianças, não ficaram por dar???
E, porque o trânsito da vida vai, certamente, continuar, quantos mais não ficarão por dar????
Chegar a tempo... Eunice lamenta, com o coração a pincelar-lhe a mão, um gato laranja que não chegou a tempo à vida da sua mãe...
Outros lamentam não chegar a tempo de ser...Alguém.
Mas a maioria, essa, passa o tempo a lamentar-se por não ter chegado a tempo de apanhar aqueles saldos, aquela promoção... De não chegar a tempo de comprar, com 50% de desconto em talão, o tal brinquedo para o Natal, a tal Barbie, a tal Kitty, a tal Carlota Cambalhota, a tal mota, o tal BayBlade, esse mágico (e caríssimo) pião...
E é assim que, principalmente neste mês de Dezembro, a vida rodopia, sem parar, nas comprar que há para fazer, no presente que falta comprar...
Mas o essencial nunca estará à venda... Paradoxalmente, é gratuíto... e não há ninguém que não se tenha lamentado, pelo menos uma vez na vida, que não o tem! É infinito... e nunca chega para alguém! Chama-se: Tempo!!!!
Que, pelo menos neste mês, se chegue ao menos a tempo de dedicar mais tempo a alguém! A um desconhecido, a um amigo, a um sem-abrigo, a um avô, avó, bisavó, tia, tio, primo, filho, filha, pai ou mãe.
E, já agora, em vez de se perder tempo a comprar isto e mais aquilo, as meias, o casaco, o colar, o chapéu para realçar a franja, por que não dar um presente a uma vida, salvando e adoptando, da rua ou de um gatil...um gato, preto, branco, castanho ou... laranja?
Ou, por que não, um cão de nariz cinzento? (Todos o têm dessa cor, não?!!!)
Mas chegue a tempo pois, nos canis e gatis deste país, os cães e gatos não duram muito tempo!
Ilustração de Eunice Rosado
Estive, ontem, num jantar de Natal de funcionários de uma firma onde trabalhei, sendo que muitos deles (dos que estiveram presentes, e dos que faltaram) entraram para essa firma depois da minha saída.
ResponderEliminarPresença predominante de homens; a TV transmitia, em directo, um desafio de futebol entre o S. L. Benfica e outra equipa. As atenções estava quase todas viradas para o ecrã.
Depois que o desafio terminou - assim como a comida - formaram-se grupos, como é habitual nestes eventos. Entretanto chegaram uns tantos, vindos do estádio.
A firma que nos uniu deixou de existir há alguns anos, fruto de uma gestão danosa e fraudulenta dos donos. Ainda foi proposto um brinde à firma mas logo foi mudado para um "A Nós!"
Na hora da despedida, entre beijos, abraços e apertos de mão, acho que fui o único a desejar Feliz Natal.
Chegar a tempo.... ou ter tempo para te ler, já é tempo ganho nunca me dou como perdido quando tenho algum tempo para te comentar!!
ResponderEliminarAcho que pecas (pelo que sei) em quereres sempre mais para os outros e tão pouco para ti. Precisas mesmo de aproveitar para dares esse passeio, e valorizar o que se tem, e é tanto, quando temos tempo para pensar nas horas perdidas todos os dias nesta lufa-lufa, que é a correria da sobrevivência... Mas ainda assim olhamos para os que nos rodeiam e damos carinho, conforto, estimulo, esperança, e não nos conformamos com o que está feito, está feito.
O desafio que travas com a vida é aliciante, quando existe razões fortes para a querermos melhorar.
Sempre estarmos a tempo de dar mais do nosso tempo, sempre existe alguém que precisa de nós, mas a vida prega-nos rasteiras e tira-nos tanto tempo com coisas sem importância. Esta quadra não é altura para desperdícios, meditar e acreditar que podemos fazer a diferença... N.S.