Vivemos numa época em que, verdadeiramente, existimos mais em função da hora a seguir do que do minuto que passa. Já não formamos gerúndios... Já não vamos sentindo...Já não vamos sendo. Ou fomos ou seremos. Ou idealizamos passados ou pressionamos futuros. Mas raramente damos espaço ao tempo e tempo que chegue ao espaço. Raramente formamos um gerúndio suficiente para o verbo sentir se demorar. Ou para o presente se tornar presente.
Ser presente significa comovermo-nos... Com os outros, connosco. Implica, muitas vezes, ficarmos mais iguais a nós próprios. Implica descobrirmos tudo o que era tão genuinamente nosso e que, com a pressa dos dias, dos meses, dos anos e da vida, fomos varrendo para debaixo do tapete do coração e da própria alma. Os afectos que escondemos, os sentimentos que não expressamos, a beleza das coisas simples que já não procuramos...
Vivemos com o coração abotoado e em silêncio, não exprimimos o que somos por dentro quase sempre por medo de sermos mal-julgados ou mal-entendidos, nunca mostramos os bastidores do nosso teatro e do nosso poema cardíaco que pode, tantas e tantas vezes, estar repleto de coisas bonitas. De coragem. De verdade. De persistência. De unidade. De bondade. De beleza. Infelizmente, aprendemos a esconder mais do que a mostrar.
Mas para amar e ser amável é essencial pormos legendas no coração. E, mais fulcal ainda, é pôr o coração a apanhar ar, tão sufocado que está pelo pó dos anos, pelo espartilho das rotinas e pela cinza das viciosas e mesquinhas comparações.
Acredito, pois, que a par do magnésio, não há melhor reforçador do músculo cardíaco do que todas as vitaminas e minerais que o Presente tem. Desde que o mesmo seja saboreado a gosto, com a alma e corpo presente.
Parar, neste sentido, não é morrer. Pelo contrário. É sobreviver. É viver sobre. É viver sobre uma vida que teima em viver-nos.
São, por isso, maravilhosos os dias, as pessoas, os poemas, os livros, os momentos, as coincidências, uma palavra, um olhar, o sorriso de sol no rosto dum filho, que nos dão o Presente de presente e nos fazem
apetecer dizer a vida de outra maneira...
Então apetecem-nos gerúndios, apetece-nos o presente demorado, apetece-nos a beleza simples, as sílabas quietas, a generosidade de ser feliz.
Apetece-nos aprender todos os inícios, a reaprendizagem do olhar, uma estrofe por completar, um sorriso litoral, um rio ou um mar à porta dos olhos, um corpo num horizonte de água, uma líquida liberdade, uma secreta embarcação, um oceano breve, um vento favorável onde deixar voar o cabelo...ou uma madeixa de alma.