Admito que, enquanto apaixonada confessa das Ciências Naturais, nunca me interessei particularmente
por Economia a não ser a economia implicada na escolha de fraldas, leites, iogurtes, fatos de treino e todos os consumíveis de marca branca com que se possa educar dois filhos interiormente ricos por dentro mas económicos por fora; a implicada nos trajectos diários da vida e nos consumíveis de uma alma que não quer morrer estúpida ou a implicada, nos meus tempos de trabalhadora-estudante (não o irei ser sempre?!), em conseguir que dois contos (que eram tudo menos de fadas!) dessem para sobreviver durante a semana e neles coubessem, com as devidas acrobacias matemáticas que a necessidade inspira, alimentação, transportes, livros e fotocópias, livros e fotocópias, livros e fotocópias, vestuário (sim, porque os estudantes também precisam de vestir qualquer coisa! E, que eu saiba, só mesmo numa praia em Timbaba, João Pessoa, é que é permitido as pessoas, estudantes ou não, "vestirem-se" com resmas de papel), consultas esporádicas (pois é, quem diria que os estudantes também adoecem!) e, por vezes, alojamento.
Ultimamente, porém, tenho-me deparado com insólitas mudanças face às quais esperava que um conhecimento mais aprofundado naquela matéria me pudesse esclarecer (na falta de um motivo mais “iluminado” do que a já tão ensombrada crise )…
Ultimamente, porém, tenho-me deparado com insólitas mudanças face às quais esperava que um conhecimento mais aprofundado naquela matéria me pudesse esclarecer (na falta de um motivo mais “iluminado” do que a já tão ensombrada crise )…
Nomeadamente, para esclarecer a
“semi-privatização” de todo o apoio médico aos estudantes da Universidade de
Lisboa e desvinculação respetiva dos serviços de Ação Social, com um aumento
execrável dos preços das consultas das várias especialidades, o que tem
conduzido a que muitos estudantes, principalmente os mais carenciados, se vejam
privados de um apoio (e direito!) fundamental
- o apoio à saúde e promoção do bem-estar – o qual
tem sido, aliás, tantas vezes,
crucial para o prosseguimento e conclusão com sucesso de tantos percursos
académicos…e de vida!
Se aprendi bem, um dos clássicos da
economia moderna, Adam Smith, resumia assim o funcionamento do sistema
económico: devemos o nosso pão fresco diário não ao altruísmo do padeiro, mas à
sua ganância.
Ou seja, é graças à ambição do ganho que os bens de que precisamos, por exemplo, chegam às prateleiras dos supermercados. Esse dado é aceite e consensualmente aceitável. Mas o que se coloca aqui é, porém, de outra natureza e envolve uma reflexão urgente.
Claro que não perde validade a justa expectativa que os serviços de apoio à saúde dos estudantes e o respetivo trabalho dos profissionais envolvidos nesse apoio produza lucro (ou não produza prejuízo). Mas este processo de reajuste dos serviços não pode ficar unicamente dependente daquilo que Adam Smith chamou “a ganância do padeiro”. Isto porque estamos num campo que é não só económico e financeiro, mas também é humano e cultural.
Ou seja, é graças à ambição do ganho que os bens de que precisamos, por exemplo, chegam às prateleiras dos supermercados. Esse dado é aceite e consensualmente aceitável. Mas o que se coloca aqui é, porém, de outra natureza e envolve uma reflexão urgente.
Claro que não perde validade a justa expectativa que os serviços de apoio à saúde dos estudantes e o respetivo trabalho dos profissionais envolvidos nesse apoio produza lucro (ou não produza prejuízo). Mas este processo de reajuste dos serviços não pode ficar unicamente dependente daquilo que Adam Smith chamou “a ganância do padeiro”. Isto porque estamos num campo que é não só económico e financeiro, mas também é humano e cultural.
Porquanto, é preciso mudar aqui,
talvez, a própria lógica dominante do lucro ou prosperidade, que os identifica
com enriquecimento material.
Que lucro terá uma Universidade cujas receitas do seu centro de saúde aumentam, mas cuja taxa de sucesso académico dos alunos diminui?
Que lucro terá uma Universidade que vê as receitas a crescer e o número de suicídios nas residências a aumentar?
Que lucro terá uma Universidade cujos estudantes abandonam os cursos no primeiro ou segundo ano por dificuldades de adaptação, ansiedade grave, depressão ou por se fecharem isolados em quartos dias, semanas, meses, em processos inexoráveis de auto e hetero destruição?
Que lucro terá uma Universidade cujas receitas do seu centro de saúde aumentam, mas cuja taxa de sucesso académico dos alunos diminui?
Que lucro terá uma Universidade que vê as receitas a crescer e o número de suicídios nas residências a aumentar?
Que lucro terá uma Universidade cujos estudantes abandonam os cursos no primeiro ou segundo ano por dificuldades de adaptação, ansiedade grave, depressão ou por se fecharem isolados em quartos dias, semanas, meses, em processos inexoráveis de auto e hetero destruição?
Que
lucro terão as famílias que depositaram, muitas vezes, as economias (e sonhos) de uma vida nessa mesma Universidade? Que lucro teremos todos nós?
Mas, principalmente, que lucro terá aquele a quem lhe é diminuído o direito de verdadeiramente enriquecer em conhecimento, desenvolvimento pessoal e em humanidade, propósito último de uma Universidade que se pretende para todos?
Mas, principalmente, que lucro terá aquele a quem lhe é diminuído o direito de verdadeiramente enriquecer em conhecimento, desenvolvimento pessoal e em humanidade, propósito último de uma Universidade que se pretende para todos?
Repensar o que consideramos vital e
prioritário para aqueles que serão os verdadeiros cidadãos do mundo e cidadãos
do futuro, é, pois, essencial. A sustentabilidade económica requer (talvez, primeiro que tudo) sustentabilidade psíquica. Não é por acaso que o
consumo desenfreado não é outra coisa senão uma bolsa de compensações. As
coisas que se adquirem são, obviamente, mais do que coisas: são promessas que
acenam, são protestos impotentes por uma existência que não satisfaz, são
ficções do nosso teatro interno.
Em suma, mudar sim, mas limitar só
para alguns a possibilidade de aceder ao essencial, não.
E este facto e a própria palavra
Economia (do Grego OiKonomia, que
significa literalmente “norma ou administração da casa”), que começou por
conhecer um uso profano em autores como Xenofonte – que utiliza a sugestiva imagem
da articulação dos dançarinos numa roda para falar do controle e da precisão
necessários ao seu bom funcionamento), acabaram também por me ajudar a
compreender porque razão uma das pessoas mais admiráveis e uma das minhas
grandes referências profissionais destes doze anos no Centro de Saúde da
Universidade de Lisboa, se recusou a continuar no mesmo. Efectivamente, face a esta situação e com as condições de "normalização da casa" agora impostas, o seu trabalho (excelente, aliás, e talvez um dos mais distintos e meritórios no panorama da Psiquiatria a nível nacional), tantas e tantas vezes realizado por puro
amor à profissão, aos alunos e às diferentes minorias que, não fora ali, e nunca
encontrariam resposta pronta e eticamente adequada no Sistema Nacional de
Saúde, deixaria de fazer sentido.
E a verdade é que, nesta Economia,
ainda há, felizmente, aqueles que se recusam a ser meros dançarinos quando a roda
está disfuncional! Outros vão mantendo a dança . Outros há que tentam melhorar
a dança para que a roda melhore também. Para bem da(s) casa(s). E de todos.
Mudou para um estilo corrosivo? Sinais dos tempos? Inteligente, muito, e nobre, raro, mas ...AHhhhhhhh...Mónica a sua poesia em prosa sente-se falta e alimenta como um outro céu. Bem haja.
ResponderEliminarQuerida Professora, andamos por cá cheias de saudades suas. Quem nos dera que acabasse já, já, já esse Doutoramento... sabemos que está sempre pertinho mas temos saudadinhas dos seus ensinamentos calminhos...Escreva mais para nós no blogue ou no face que a gente sente-se mais acompanhadas e motivadas e dá-nos aquela força que só a professora sabe...Abracinhos para a sua Bia e para o seu Tiaguinho e um gigante para si de todas nós que a adoramos de coração. saudades e mais saudades. Catarina em nome de todas da LEB 1
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